O capital social e outras conexões no segundo capítulo das nossas crônicas semanais
Por Wesley Bonato
O PONTO DE PARTIDA
Em um mundo pós-apocalíptico, onde a América está à beira do colapso, surge Death Stranding, um game permeado pelas implicações da falta das conexões humanas e fantasmas das EPs. Criado pelo visionário Hideo Kojima, a obra transcende os limites do entretenimento e mergulha nas profundezas da filosofia e da sociologia, destacando a importância das relações e conexões humanas em um cenário desolador.
No jogo, os jogadores assumem o papel de Sam Porter Bridges, interpretado por Norman Reedus, um homem cuja missão é reconectar uma nação fraturada após uma série de eventos cataclísmicos. Enquanto atravessa paisagens áridas e perigosas, Sam carrega consigo uma carga preciosa: as relações humanas. Essas conexões são representadas de maneira literal através de “BBs” (Bridge Babies), bebês em cápsulas que permitem ao jogador sentir as emoções e as experiências dos outros personagens.
PONTES DE APOIO
Simbolicamente falando, Death Stranding se aprofunda no conceito de interconexão humana, a jornada de Sam reflete a necessidade dos seres humanos se conectarem e colaborarem em face da adversidade. Como Teilhard de Chardin argumentava, a evolução humana não é apenas biológica, mas também social e espiritual. A busca de Sam para reconectar a América pós-apocalíptica destaca a importância de superar não somente barreiras físicas, mas também emocionais para alcançar a próxima fase do processo evolutivo, trazendo aí a figura da cooperação mútua como ferramenta de apoio.
Death Stranding também aborda a ideia de “anomia”, um conceito desenvolvido por Émile Durkheim. A anomia se refere ao estado de desintegração social em que as normas e valores comuns são perdidos. No mundo do jogo, a anomia está representada pela fragmentação da sociedade e pelo isolamento das pessoas. Sam, como um “conector”, enfrenta o desafio de superar a anomia e restaurar as conexões sociais perdidas, criando pontes de apoio entre a humanidade restante. Sua jornada é uma metáfora poderosa para a necessidade de reconstruir laços sociais em um mundo onde a alienação e o isolamento prevalecem.
RELAÇÕES HUMANAS E O CAPITAL SOCIAL
Além disso, a teoria do “capital social”, desenvolvida por Robert Putnam, também pode ser observada no game. O capital social se refere ao valor das relações interpessoais e à capacidade das pessoas de trabalharem juntas para alcançar objetivos comuns. Em Death Stranding, a carga preciosa de Sam não é ouro ou petróleo, mas sim conexões humanas – um tipo único de capital social. Ele deve investir essas conexões para superar os obstáculos e reunir as pessoas em torno de um propósito comum.
O jogo incentiva os jogadores a colaborar, compartilhando recursos e informações uns com os outros. Os jogadores podem construir estruturas, como pontes e abrigos, que beneficiam não apenas a eles mesmos, mas também outros que atravessam a mesma área. Isso serve como reflexão da ideia de que o capital social aumenta conforme as pessoas trabalham juntas para alcançar objetivos comuns. A cooperação mútua é uma parte fundamental da experiência de jogo e nos demonstra como as relações interpessoais podem ser valiosas em situações desafiadoras.
POR FIM
Em última análise, Death Stranding nos lembra de que, mesmo em um mundo apocalíptico, as relações humanas são o alicerce da nossa existência. Como Sam Porter Bridges, navegamos por esse mundo desafiador, carregando não apenas carga física, mas também o peso das nossas interações e conexões com outros. A obra nos convida a refletir sobre como, em nossa própria jornada, podemos superar barreiras, reconectar-nos e, assim, construir uma sociedade mais forte e solidária. Afinal, não há coisa mais frágil do que esta raça humana, e, ao mesmo tempo, não há coisa mais poderosa do que suas conexões e relações.